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17 ABR 2019
17 abril 2019 às 06h30

Medo do Brexit? Portugueses campeões na busca por universidades britânicas

Nos últimos dois anos, Portugal foi o país europeu que, em termos percentuais, mais cresceu nas admissões em universidades do Reino Unido. Governo britânico garante o financiamento de propinas a alunos estrangeiros.

Pedro Vilela Marques

"Já no ano passado, quando estava no 11.º ano, tinha ouvido falar do programa que financia as propinas nas universidades do Reino Unido. Na altura tinham dito que este podia ser o último ano em que isso estava garantido e não quis perder a oportunidade." Guilherme Militão tem 20 anos e apesar de ainda nem ter concluído o 12.º ano, na Escola Profissional de Artes, Tecnologias e Desporto em Lisboa, já sabe que tem entrada garantida na universidade de Middlesex, em Londres, para tirar uma licenciatura em Fotografia. "Até lá só tenho mesmo de me concentrar em acabar o secundário."

Nos anos em que as incertezas em torno do Brexit afastaram muitos alunos do resto da Europa de universidades britânicas, os estudantes portugueses procuraram cada vez mais estudar no Reino Unido. Nos últimos dois anos, Portugal foi mesmo o campeão, em termos percentuais, na subida de admissões de alunos estrangeiros. Este ano promete ir pelo mesmo caminho e quem acompanha os processos garante que os estudantes vão continuar a ter acesso ao programa do governo britânico que financia as propinas para fazer uma licenciatura ou um mestrado no Reino Unido.

O Brexit foi referendado em junho de 2016 e a verdade é que de lá para cá tem havido um crescimento sustentado no número de alunos portugueses que querem estudar no Reino Unido: em setembro de 2017, a OK Estudante, empresa de consultoria académica especializada no ensino superior, colocou cerca de 1200 estudantes em universidades britânicas, número que passou para mais de 1500 um ano depois.

Dados do Universities and Colleges Admissions Service (UCAS, o Serviço de Admissões de Universidades e Faculdades do Reino Unido) mostram que Portugal foi mesmo o país que mais cresceu nesta área nos dois últimos anos, numa altura em que as dúvidas em torno do processo de saída do Reino Unido da União Europeia levaram ao arrefecimento da procura internacional.

Existem dúvidas, "mas dos pais"

Em 2017, quando a maioria dos países europeus teve uma quebra de entradas no ensino superior britânico, Portugal registou um aumento de 24% nas admissões - mais 230 alunos - nas universidades do Reino Unido, a maior subida de toda a Europa. Em 2018, ano em que o ligeiro crescimento de candidaturas de alunos do resto da Europa (52 600) ainda não chegou aos níveis pré-referendo, a procura portuguesa foi ainda maior: mais 535 admissões do que no ano anterior, um aumento de 45%. E agora, como prova dessa subida em contraciclo, a agência portuguesa espera enviar dois mil alunos para universidades britânicas já em setembro.

Um crescimento que obrigou a OK Estudante a franchisar a marca, com a criação de agências em Vila Real e em Coimbra. "Percebemos que tínhamos muitos pedidos de alunos dessas zonas, o que nos levou a ir ao encontro dessa procura", explica a general manager da OK Estudante. E receios sobre o Brexit, não existem por cá? "Existem dúvidas, mas dos pais", responde Maria de Castro. "São eles que, quando acompanham os filhos, colocam as maiores questões. Mas apresentamos os casos de alunos que já lá estão e explicamos que o programa de propinas 100% financiadas está assegurado mesmo com o Brexit." Dúvidas que a agência esclareceu durante a Futurália, a feira de educação que se realizou no último fim de semana em Lisboa, onde professores de 18 universidades britânicas e alunos portugueses contaram como é viver e estudar no Reino Unido.

As licenciaturas são financiadas a 100%, para qualquer curso realizado numa universidade do Reino Unido, e para os mestrados há o valor máximo de 11 mil libras (13 mil euros) por aluno. A devolução do financiamento começa um ano após o estudante ter concluído a sua licenciatura ou mestrado, em prestações mensais que podem prolongar-se por 30 anos, e desde que o seu rendimento anual seja superior a 25 mil libras (30 mil euros), isto no caso de ficar a trabalhar no Reino Unido.

Se os estudantes regressarem a Portugal, esse patamar mínimo de rendimentos baixa para os 20 500 euros brutos/ano e terão de acertar diretamente os termos de pagamento com o programa Student Finance. Sempre com a noção de que, se estiverem desempregados, podem interromper a devolução enquanto não conseguirem trabalho.

O incentivo ao trabalho

O financiamento atribuído pelo Reino Unido cobre o custo das propinas, que num curso de três anos rondará um total de cerca de 35 mil euros. Todos as outras despesas ficam por conta dos jovens, embora Maria de Castro argumente que "os estudantes têm apenas entre 12 e 17 horas de aulas semanais e o sistema está montado de forma a que trabalhem enquanto tiram os cursos, o que ajuda nas contas e a ganhar logo experiência profissional".

Esse é, aliás, um dos ímanes que atraem portugueses para estudar em Inglaterra: a parte prática dos cursos, a ligação ao mercado de trabalho. "Eu já sei que vou ter de trabalhar durante o curso", admite Guilherme, que vai partilhar casa em Londres com três colegas. "As universidades incentivam os alunos a ter um trabalho e a renda sempre fica mais barata." A procura da independência financeira, mas também de uma educação de nível internacional - a Middlesex University apresenta-se como uma das 150 melhores do mundo nas áreas das artes e design - e a afinidade com a língua são outros dos argumentos de peso. "Achei que tinha de aproveitar esta oportunidade para estudar fora, porque não sabia se o programa continuava para lá de 2019", conclui o estudante de audiovisual.

Até setembro, o governo britânico assegura financiamento aos estudantes europeus, através do programa Student Finance, "mas o que sabemos é que o último acordo do Brexit que esteve a discussão previa que o programa se prolongasse pelo menos até 2021 e o embaixador do Reino Unido em Portugal já afirmou publicamente que esta é uma aposta do governo britânico", refere Maria de Castro.