30 março 2018 às 01h08

Duplo amputado vai voltar a competir e sonha com a Fórmula 1

Billy Monger perdeu as pernas depois de um brutal acidente em abril de 2017. Um ano depois vai voltar às pistas na F3 britânica.

Isaura Almeida

Billy usa calções sem complexos. Não quer, ou sequer pretende, esconder as marcas das amputações sofridas, em abril de 2017, após um brutal acidente durante uma prova de Fórmula 4, no circuito de Donington Park, no Reino Unido. Assim como não escondeu a satisfação por ter voltado a conduzir um monolugar, em fevereiro, e poder agora voltar à competição.

Será este fim de semana, na primeira etapa da Fórmula 3 britânica, em Outlon Park, com o sonho da Fórmula 1 presente. "O meu sonho é pilotar na F1 desde que tinha oito anos. É um grande desafio, mas eu gosto de me esforçar. O acidente deixou-me mais forte e ajudou-me a tentar chegar à F1", admitiu o jovem de 18 anos, que irá começar por conduzir um carro adaptado.

O monolugar da Carlin Racing que vai conduzir este fim de semana tem uma alavanca no volante para acelerar com a mão direita, e com a mão esquerda pode colocar as mudanças. Além disso, tem ainda outra alavanca na direita para ativar o pedal do travão. "No momento é apenas uma corrida, mas espero confirmar a minha presença em breve para o resto da temporada", confessou o jovem piloto de 18 anos na rede social Twitter, ele que recebeu uma autorização especial para ter quatro carros ao invés dos três habituais permitidos.

O porta-voz da equipa não escondeu que "é incrível" ter Billy de volta à pista: "Isso ajuda a motivar a equipa. Ele é competitivo e tem potencial para fazer muitas coisas. Nós queremos ser capazes de ajudar a espremer esse potencial."

Para poder voltar a conduzir um carro de competição, sem ser em provas próprias para deficientes, e sonhar com a F1, Billy Monger teve de ultrapassar mais um outro obstáculo: uma lei da Federação Internacional do Automobilismo, que impedia amputados de competir em categorias internacionais de monolugares.

Acidente brutal e amputação

"Foi o pior acidente de que há memória no automobilismo", escreveram os jornais britânicos em abril de 2017, dando uma ideia da violência do embate de Billy durante uma prova de Fórmula 4, quando ia a mais de 200 km/hora e embateu num carro que estava quase parado na pista, e que ele não viu por estar tapado por um outro carro em andamento. Não teve tempo para travar e o choque foi brutal. Foram necessários 90 minutos para o desencarcerar.

Quando acordou, o piloto tomou conta da nova realidade. Tinham-lhe amputado as duas pernas: "Nunca me lembrei de nada nos três dias seguintes, já que fui posto em coma. Estava a dormir enquanto a operação principal ocorreu. Sabia que os meus ferimentos eram sérios, mas não sabia se perderia as minhas pernas. Quando voltei, era diferente! Ninguém espera acordar sem pernas."

Depois passou pela fase do choro, da revolta, da frustração... até reaprender a viver sem pernas e "querer recuperar", com a ajuda de milhares de pessoas, entre elas as estrelas de F1, Lewis Hamilton, Jenson Button (doou 18 mil euros, por exemplo), Felipe Massa, Mark Webber ou Max Verstappen.

Billy precisava de 300 mil euros para fazer uma recuperação rápida e eficaz, mas a família não tinha esse dinheiro e lançou uma ação de crowdfunding (peditório online), que reuniu mais de um milhão de euros. Uma prova de como a história do jovem piloto sensibilizou toda a comunidade automóvel e extravasou as pistas, acabando por ter um efeito boomerang.

Billy saiu do hospital de cadeira de rodas e próteses, mas, três meses depois do acidente, voltou a entrar num carro para competir. Foi numa prova de endurance, para pilotos com vários tipos de deficiência. Mas ele queria mais e foi à luta por um lugar entre a competição dita normal.

E encontrou na equipa Carlin Racing a parceira ideal para essa luta, pois nem todas as equipas estavam na disposição de adaptar um monolugar à necessidade de um piloto sem pernas. Começou por conduzir no simulador até estar apto a entrar num monolugar de novo e agora vai voltar a competir. A recuperação física e psicológica foi vista como um exemplo de superação e o piloto foi nomeado para os prémios Laureus, óscares do Desporto, na categoria Melhor Momento Desportivo do Ano.