20 janeiro 2018 às 00h19

A campeã nacional de estrada que quer estar nos Jogos Olímpicos com 40 anos

Inês Monteiro esteve seis anos sem competir devido a graves lesões. Mas voltou em grande estilo depois de ter sido mãe. A atleta do Sporting, de 37 anos, diz que ainda tem muito para conquistar e já olha para Tóquio 2020

André Cruz Martins
André Cruz Martins

Inês Monteiro, atleta de 37 anos do Sporting, sagrou-se há uma semana campeã nacional de estrada pela quinta vez, na prova de 10 km com partida e chegada no Estádio Nacional com o tempo de 33 minutos e 37 segundos. Esta conquista tem a curiosidade de surgir 13 anos depois do seu último título nesta competição e permitiu-lhe igualar o recorde de Dulce Félix - cinco triunfos.

"É sempre agradável ganhar mas foi uma surpresa. O nosso objetivo era conquistar o título coletivo para o Sporting, mas a partir do meio da prova percebi que o título individual era possível. Dei tudo e consegui ganhar", referiu ao DN, recusando-se para já a pensar em tornar-se a única recordista em 2019, deixando a companhia de Dulce Félix. "Ui, ainda falta tanto para o Campeonato Nacional de Estrada do próximo ano... Vai haver muito treino pela frente e também teremos de ver se a prova fará parte dos objetivos do Sporting no ano que vem", sublinhou a fundista, que tem 11 medalhas internacionais no currículo.

Esta vitória soube ainda melhor depois do interregno a que esteve sujeita durante seis anos: entre 2010 e 2016 não competiu devido a uma série de graves lesões no joelho direito. "Foi terrível, houve momentos em que pensei desistir do atletismo. Ainda bem que mantive a força e fui teimosa, trabalhando no duro para um dia regressar. Agradeço muito às pessoas que me apoiaram, sem elas nada disto teria sido possível. Nomeadamente ao médico que fez a minha última cirurgia, ao meu fisioterapeuta, ao treinador, aos meus amigos Esta vitória no Campeonato Nacional de Estrada também é um pedacinho de cada um deles", realçou.

A grande força psicológica é uma das suas imagens de marca. Quando tinha 18 anos, o pai morreu subitamente, algo que não a impediu de participar no Campeonato da Europa de juniores em corta-mato e de trazer a medalha de prata, que fez questão de dedicar ao pai.

A pensar no Europeu de crosse

A vida não parou depois do triunfo no Nacional de Estrada e Inês Monteiro já estabeleceu como grande objetivo a curto prazo "ajudar o Sporting a lutar pela vitória na Taça dos Campeões Europeus de crosse", algo que considera "possível, porque a equipa é forte, apesar de haver adversários de grande valia que também têm o mesmo objetivo".

Inês Monteiro continua a ser a detentora de três recordes nacionais: 5 mil metros sub-23 (alcançado em 2002), a mesma distância no escalão júnior (2002) e a milha em juniores, igualmente em 1999: "Certamente não vão durar para sempre, mas fico lisonjeada por esses recordes ainda me pertencerem. Se ainda não foram batidos é sinal de que são excelentes marcas. Aliás, na altura, já eram marcas bastante boas para o escalão sénior."

No Sporting há apenas três meses, a veterana atleta diz que encontrou um clube muito diferente do de 2000, aquando da sua outra passagem pelos leões, antes de representar JOMA, Maratona e CA Seia. "Tem sido uma experiência muito positiva, até porque o Sporting mudou para muito melhor. Nota-se muito mais ambição e profissionalismo e, acima de tudo, realço o ambiente mais saudável. Somos uma verdadeira família no atletismo e damo-nos todos muito bem, sem aquelas rivalidades habituais num clube grande", considerou, acrescentando que "os dirigentes e treinadores estão sempre prontos a ajudar as atletas sempre que existe algum problema".

Apesar de representar o Sporting, Inês continua a viver na Guarda, onde é funcionária da câmara nas piscinas municipais. "Sou professora de natação e claro que é difícil conciliar esta profissão com o atletismo e vida familiar. Se há algo que sai da ordem natural, tudo vira um caos! No entanto, consigo fazer tudo e só tenho de agradecer a compreensão dos meus colegas e do município da Guarda", referiu. Ainda por cima, Inês foi mãe há dois anos e meio, o que fez que o seu tempo disponível diminuísse drasticamente: "É verdade, mas como já disse, tudo se consegue. Aconselho todas as mulheres a passar pela experiência da maternidade e ainda por cima tenho a sorte da Carolina ser uma filha calminha."

Curiosamente, foi depois de ser mãe que a atleta voltou à competição. "Pouco tempo depois de ter sido mãe, regressei aos treinos, mas tive uma fatura de stress e voltei a parar. Mas passadas algumas semanas regressei e não voltei a ter problemas físicos. A minha filha dá--me muita força, quando estou um pouco mais desanimada, basta pensar nela e fico logo com a moral levantada", diz a atual campeã nacional de 3000 metros em pista coberta.

A longo prazo, Inês Monteiro tem o sonho de participar nos Jogos Olímpicos de Tóquio em 2020, numa altura em que terá 40 anos. "Sinceramente, acho que é possível e estou muito confiante de que irei conseguir os mínimos. Foi mau ter estado parada durante seis anos mas isso teve um efeito positivo, que é o de me ter permitido recuperar algum fôlego e apresentar menos desgaste. A concretizar-se, serão certamente os meus últimos Jogos Olímpicos, pois não me estou a ver a participar com 44 anos", brincou a atleta, que esteve presente nos Jogos de 2004 e 2008.

No entanto, apesar de se sentir bem em termos físicos, Inês Monteiro reconhece que necessita de ter muito mais cuidado. "Em primeiro lugar, o tempo de recuperação é mais demorado do que quando tinha 25 anos. Por outro lado, dado o meu histórico de lesões graves, necessito de ter um controlo bastante rigoroso no treino. Hoje em dia é impensável realizar treinos bidiários", apontou.

Caso consiga realizar o sonho de estar nos Jogos Olímpicos com 40 anos, uma das primeiras pessoas em quem irá pensar será na tia Fátima Neves, antiga fundista do Braga e do Maratona que também representou a seleção nacional. "Quando eu tinha 5, 6 anos, via a minha tia correr e só queria um dia ser como ela. E foi ela que me inscreveu aos 11 anos num clube de atletismo na Guarda. Tudo começou aí", recorda.